terça-feira, 20 de novembro de 2012

Autonomia como condição e desejo


O ato de educar é, em si mesmo, o ato da busca da autonomia. Autonomia esta desencadeada pelo processo e fortalecida por ele, os agentes externos ocupando papéis que auxiliam e não devem definir as direções tomadas pelo sujeito, o aluno. A diversidade, no contexto de busca da autonomia, apresenta-se, no meu ponto de vista, como um aspecto que, por não ser um agente direto e claro como o professor, exerce de forma sutil uma influência capaz de grandes mudanças, ou de grandes conservações. Olhar o diferente em afirmação do eu, ou olhar o diferente em paralelo ao eu? São pontos de vista, óticas questionadoras, presentes em uma sala de aula.
As minorias no Brasil, ou em qualquer lugar do mundo, sempre foram movimentadas em direção ao seu final. Os povos originários ou se adaptaram a cultura ocidental por vias de um processo civilizatório, citado por Norbert Elias, violento ou não, ou caminharam em direção a um isolamento imposto que gera como produto a inconstância de discursos entre estes grupos e os poderes constituídos de forma legal no Brasil, juridicamente falando. Os índios não são nenhuma minoria, mas o processo de construção destes como tal os segregou, os marginalizou. Os negros passaram por semelhante processo, expatriados de sua terra e escravizados no Brasil, obtiveram, por meio de um processo histórico brutal de marginalização, a mesma condição periférica dos índios, em relação a um ordenamento jurídico. A eugenia, a imigração europeia sob a égide de ‘branqueamento’ da população brasileira são somente exemplos do processo em si.
A Constituição de 1988 mudou alguns destes paradigmas, mas o quadro em si, do meu ponto de vista, não tem sua mudança atrelada a somente um norteador jurídico, ao menos em termos de futuro. No que concerne à educação, somente a partir de 1988 se vislumbrou, sob a forma da legalidade política, a produção de livros didáticos que contemplassem a cultura indígena e somente a partir de uma resolução de 2003, que a história e cultura negra brasileira passou a ser contemplada em sala de aula, como obrigatoriedade. Os avanços são parcos e obscurecidos, muitas das vezes, por uma sutileza gritante, se me permitem a redundância. As Universidades Federais são um exemplo disso: se antes da lei das cotas apenas 3% dos seus estudantes eram negros e, admitindo um paradigma positivista quantitativo, se vermos o número de professores que são negros, justifico a minha posição. “Algo está errado”, é a primeira coisa que penso.
Piaget afirmava que a educação, como processo de aprendizado, se dá pela fisiologia e pelas interações sociais que temos. Admitindo a diversidade podemos aprender muito mais do que simplesmente a substância, formatada como conteúdo, que nos é transmitida. O ato de educar como ato de autonomia é isso. O professor tem um papel, em sala de aula, de mediação das diferenças em um sentido de ‘paralelização’, ou seja, tem um papel de proporcionar uma visão diferente daquela que considera o outro como inimigo. Autonomia em forma de decisões, autonomia em forma possibilidade, por parte do sujeito, de visão da cena completa, do entendimento do contexto. O preconceito é uma construção social e histórica que se formalizou ao longo dos tempos sob a forma de discursos de ‘pureza’, de ‘retorno’, de ‘totalitarismos’, ou de outras deformações tão claras ao mesmo tempo em que tão estúpidas destroem as possibilidades. Neste sentido, o ordenamento jurídico é importantíssimo, mas o caminho de sua sublimação em uma real mudança é mais tortuoso, é mais difícil e passa, consequentemente, pela educação.

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

ENEM


Fiz o ENEM no final de semana e, traçando um paralelo, poderia compará-lo as eleições americanas. Poderia também compará-lo as eleições como um todo, municipais brasileiras, e, deixe-me ver o que mais aconteceu nesses últimos tempos: … Acho que isso, por enquanto, é irrelevante. O ENEM, à meu ver, não passa de uma estratégia e, em certos aspectos, uma estratégia bem articulada. Toda aquela história de unificação de uma prova para todos os estudantes, ou possíveis estudantes, a facilitação da entrada em uma Universidade, a concessão de bolsas do Governo Federal... servem como recursos de uma estratégia que, a longo prazo, terá um papel alienatório. A alienação é um estado de inércia, o olhar fixo que nos fala Erasmo, e consequentemente de permanência. O ENEM, apesar de suas implicações pedagógicas do 'fazer pensar', aliena todas as escolas, principalmente as públicas, ao seu bel-prazer de 180 questões. As escolas particulares já estão formatadas nessa direção há muito tempo.
Quando digo alienação vejo um norte bem definido: As propostas pedagógicas autônomas se dissolvendo em favor da colocação no ENEM. Os estudantes, que já não muito preocupados com os conteúdos, exigem de alguns professores que as suas aulas se configurem às necessidades 'eneísticas', interrompem um processo e fundam um novo, porém não tão 'novo assim'. Essas experiências de totalidade não costumam dar muito certo. Costumam, a caráter longínquo, disfarçar certas atrocidades e obscurecer possibilidades. A Escola de Frankfurt, instituto alemão de pesquisa social, forjou o conceito de 'Industria Cultural' que, no meu ponto de vista, se encaixa perfeitamente a este experiência de prova única. Vejam bem, não tenho nada contra a prova do ENEM, mas sim contra o seu caráter totalizante de ingresso ao vestibular. Aos poucos a prova esta forjando um modelo único, padronizado, que assim como a 'Indústria Cultural' assenta segmentos sobre o pseudo-individualismo. O ENEM como prova, ou seja, o ENEM em si, possui um caráter próprio e até necessário em sentido de avaliação, mas a sua utilização como o modelo geral, que expõe as escolas a uma mudança que, às vezes, as destituem ainda mais de sua autonomia.
Estudei em uma escola particular no Ensino Médio. Nesta escola a média do ENEM servia como propaganda mercantil: "tragam seus filhos para o nosso colégio, temos a melhor média do ENEM de toda a região". Porém, os laços que formei nessa escola foram justamente os mesmos que formei com todos os Brunos da minha sala, no dia da prova, ou seja, nenhum. Não posso culpar totalmente a escola, é claro. A falta de socialização tem muitos fatores a considerar, sendo que a vontade desta também pode ser abalada, mas, como estudo comparativo, identifiquei nas escolas públicas o registro de laços muito maior do que no ensino privado. O ponto que quero chegar com tudo isso é: as escolas estão mudando sua razão de ser em nome da reprodução do modelo do ENEM, ou melhor, da nota do ENEM.
O paralelo que queria traçar no início do texto era mais ou menos esse: as eleições, na democracia representativa, são a somatória de fatores, não a totalidade. As escolhas muitas vezes se baseiam na não participação, muito mais do que na participação. Não quero, vejam bem, com isso, defender outro modelo, ou gerar uma 'alternativa' mais participativa, mas, simplesmente, ilustrar um processo. O processo que se baseia em uma maioria não-participativa é o mesmo que produz um modelo de prova, de avaliação, que assume um caráter total, um parâmetro que, obviamente, não pode sê-lo. 

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

O Pequeno Príncipe e a noção de Pegada Ecológica

A proposta de nosso grupo como atividade interdisciplinar deveria relacionar quatro disciplinas que, a primeira vista, poderiam ser vistas como instransponíveis no sentido de relação. Física, Letras, Biologia e Ciências Sociais se agruparam para a elaboração de um projeto que as contemplasse em sua totalidade, ou seja, não explorasse somente os lugares comuns delas. Precisavamos amarrar a proposta em um todo bem definido que as fizesse girar, as gurias da Letras surgiram primeiramente com Kafka e depois, em consenso, trouxeram 'O Pequeno Príncipe', excelente escolha. Nunca havia lido. Ronaldo, da Biologia, recomendou a Pegada Ecológica como atividade possível, fácil de contemplar todas as disciplinas, bastante interativa e 'amarrável' com o Princípe. Tínhamos o esqueleto da atividade que foi se desenvolvendo primeiro individualmente e depois como um todo, o produto foi a apresentação. 
Por ser da área de humanas, da Sociologia, enxergo no processo, mais do que no resultado, o valor de uma pesquisa, de uma proposta ou de um fato, não podemos deslocar nada da realidade com uma frieza objetiva. A sociologia não é, como muitos tentaram afirmar, uma ciência dura, objetiva, estatística, ou, ao menos, não somente assim. Depois de ler 'O Pequeno Príncipe' as coisas ficaram ainda mais claras pra mim, ao menos nesse sentido. A beleza do livro esta na sua simplicidade que não é simplória. Nas suas pretenções, tão sutis e imperceptíveis, que não são pretenciosas, Antoine Saint-Exupéry não nos mostra o objetivo, o resultado, mas, com certeza, nos mostra algo que, na minha opinião, sublima-se em um caminho. O belo final, a morte que não é morte, o caráter forte e sincero do pequenino que me lembrou o Ingênuo, de Voltaire, nos fazem viver aquele momento de leitura. Promove em nós um deslocamento da realidade que, ao mesmo tempo que intenso, é capaz de extirpar um pouco daquele caráter de rapidez e produtividade que caracteriza nossa Era. A pegada ecológica, ao contrário, ou talvez da mesma forma, nos joga em uma realidade de auto-questionamento, a comparação que nos choca, o impacto que nos é imputado, talvez nos façam cuidar de nossos próprios 'Baobás'. O rastro é uma parte de nós, uma parte que fica e influencia.
...

O ponto de intersecção mais claro, no meu ponto de vista, entre ‘O Pequeno Príncipe’ e a noção de pegada ecológica, pode ser expresso pela frase dita pela raposa, após explicar ao pequeno príncipe o que era “cativar”, os laços de necessidade que surgem após ela, como ação:
Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”.
Os laços são feitos e são eternos, são estes que fazem, como o Príncipe, sermos cativado por uma rosa em meio a tantas outras. A pegada ecológica é somente o produto disto. A noção de pegada, de rastro, que deixamos no planeta a partir de nossas ações, do nosso consumo, está intrínseca ao nível de laço que enxergamos na necessidade de interação com ele. Tanto as nossas ações, como indivíduos, quanto as ações dos países, conjunturais, ou dos interesses, como agentes definitivos, estão interligados a noção que possuímos e se percebemos, ou não, o tamanho do impacto dos rastros que deixamos. Se cativamos, ou somos cativados, nossa visão é, consequentemente, diferente.
A Sociologia pode entrar nesse contexto como um parâmetro para a análise do social, ou seja, das ações, interações ou omissões entre os indivíduos enquanto seres sociais, afinal, a sociedade não é, simplesmente, a soma dos indivíduos. Conceitos de Marx como: o fetichismo de mercado (o consumo em si e a sua necessidade), quanto a mais-valia (lucro e razão de ser do Capitalismo, ou seja, razão de ser do consumo) ou a alienação (produzida a partir de um consumo em si, indiscriminado) podem ser explorados. A sua concepção de divisão do trabalho, aprofundada e modificada, por outros meios, em Durkheim: A especificidade cada vez maior no trabalho da sociedade moderna. Especificidade esta que acaba produzindo laços de dependência entre os ‘sujeitos sociais’, nós, que gera, por fim, uma noção de solidariedade. Solidariedade, é claro, ligada a necessidade.
A pegada ecológica é, neste contexto, um olhar sobre si que é possível somente a partir da compreensão de nossa responsabilidade (nossa ação como sendo coletiva, apesar de individual). A expressão: ‘Privatizamos o lucro e socializamos o prejuízo’, basta para afirmar esta máxima, ou seja, ter um olhar sobre os gráficos que atestam a diferença de rastro entre países ‘desenvolvidos’ e ‘subdesenvolvidos’ ilustram este olhar sobre si. Entretanto, o olhar e a posterior ação perante esta diferença passam por uma formação da ideia de sujeito autônomo, formado, este é o papel, por um processo educativo que saiba aliados aos impactos e as causas daquilo que cultivamos.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Saberes Docentes e Formação Profissional

Acredito que a grande contribuição (ou pelo menos a primeira) do texto de Tardif é a clara divisão que faz, acerca dos perigos que rondam, (d)o "mentalismo" e do "sociologismo". Representantes das respectivas 'correntes' explicativas, dentro do processo da educação, costumam puxar para si a responsabilidade, egocêntrica até, de dar de conta de um processo tão complexo como este. Tardif aborda, em específico neste processo, a formação do professor e a formação de seus saberes que não pode, pela sua própria complexidade, ser subjugado por somente uma teoria, ou uma corrente, em específico. "(...)o saber não é uma substância ou um conteúdo fechado em si mesmo; ele se manifesta através de relações complexas entre o professor e seus alunos. Por conseguinte, é preciso inscrever no próprio cerne do saber dos professores a relação com o outro, e, principalmente, com esse outro coletivo representado por uma turma de alunos." Tardif.
Os saberes são vários: “(...) apresentam-se como doutrinas ou concepções provenientes de reflexões sobre a prática educativa no sentido amplo do termo, reflexões reacionais e normativas que conduzem a sistemas mais ou menos coerentes de representação e de orientação da atividade educativa.”
Saberes da formação profissional: a formação profissional é contínua. No texto "Profissão Docente", a autora Sonia Penin fala em 'profissionalidade', a 'profissionalidade' (profissão e personalidade) é uma somatória de fatores que constituem um (ou o) ser docente. A escolha da profissão já é fruto de diversas escolhas pessoais, fruto de uma educação familiar e primariamente formal que possibilita uma primeira visão de mundo ao sujeito, dá os subsídios de ação que envolvem as várias escolhas que este deve realizar. Escolher a carreira docente, em um contexto de Brasil século XXI, se apresenta como uma escolha ainda mais pautada em uma coragem, em uma busca, que transpassa, ou deixa de transpassar, outras escolhas profissionais. Bem, mas então sou eu falando. A Construção de um saber da formação profissional é constante, passa, posteriormente a escolha, a um processo formal, no caso do Docente, em uma Universidade ou no Magistério, mas que não se encerra com um diploma, mas numa somatória com outros saberes.
Saberes Disciplinares, aqueles saberes que circundam a disciplina específica do professor. Apesar de muito ser falado atualmente em Interdisciplinaridade, ou Multidisciplinaridade, vemos ainda que cada formação disciplinar possui uma matriz própria, certos atalhos e desafios que a tornam mais específica. Metodologias que formam o ser docente. Formam a Profissão.
Saberes Curriculares se estendem aos saberes das disciplinas, ou seja, os saberes 'formais' do curso do qual o docente provém e o qual ele dará continuidade com seus alunos.
Saberes Experienciais são os saberes formados e 'formantes' do ser docente. A partir da experiência em sala de aula, com os colegas de profissão em conselhos e reuniões, bem como o contato com os gestores da escola e dos pais dos alunos (A Comunidade Escolar em si) formam aos poucos o saber experiencial do professor, formam suas estratégias perante as situações que o cercam e resolvem, a partir destes, ou não, os problemas que se apresentam das mais diversas formas.
O saber docente é um saber dúbio, mas não paradoxal. Dúbio, pois deve ser expressado, pensado e, por fim, existente no âmbito do conhecimento de si e do conhecimento dos outros sujeitos que são a parte integrante e mais latente de todo o processo: os alunos. O professor deve se enxergar e enxergar os outros, não se enxergar nos outros, apesar de que esta parte é inevitável. (A nossa identidade é muito mais aquilo que não somos, do que somos, é, por fim, a constituição da diferença, mas o Saber Docente não é paradoxal nesse sentido). Existem duas guiais do conhecimento que não se contradizem, o conhecimento é multidisciplinar e alcança tantos níveis que não pode ser reduzido em uma perspectiva linear. A profissionalidade e os saberes se completam nesse ponto.






Obs:
A imagem da execução de Sócrates foi escolhida por mim arbitrariamente como a exemplificação de uma consequência nefasta dos saberes. Foucault diria que as Estratégias de Saber são as Estratégias de Poder e, portanto, a imagem de Sócrates bebendo cicuta sintetiza uma incongruência nesse caminho. 



quinta-feira, 11 de outubro de 2012

TCI's e Letramento Tecnológico


O letramento tecnológico, no que concernem as tecnologias de comunicação e informação, é cada vez mais rápido, cada vez maior, atingindo pessoas em uma tenra idade e tornam-se praticamente um objeto sem o qual a vida, ou as maneiras de enxergá-la, impossível. O homem se move em direção a preguiça, diriam os economistas, e, tratando-se da tecnologia, a sentença não pode ser mais correta. O homem se move no sentido de poder parar logo a diante, o descanso, tratando-se de tecnologia, deve ser uma constante e nos movemos nesse sentido. A internet chegou a um nível que, há 15 ou 20 anos, seria impensável. Os i-phones, i-pads e as redes sociais são cada vez mais reais, estão cada vez mais próximos e o analfabetismo tecnológico torna-se uma realidade igualmente mais comum, a criação de uma nova linguagem é mais real.
As instituições necessitam acompanhar os avanços desta instituição paralela, a tecnologia, que já não reivindica mudanças, mas age mais incisivamente na construção de uma periferia. A educação, nesse contexto, é um belo exemplo de adaptação, ou não, desta nova realidade. O letramento tecnológico é cada vez maior em crianças de tão poucos anos que já não sabemos distinguir o que é natural nesse processo e o que deve ser, senão controlado, ao menos, observado atentamente. Não podemos confundir curiosidade com uma montanha de produtos tecnológicos que ficam obsoletos em um ritmo bem rápido. A educação esta inserida nesse contexto, é claro, o processo educacional nos é extremamente essencial, nos é constante. Os saberes docentes são modificados a medida que os alunos conseguem construir em uma linguagem que, em uma grande parte dos professores, por eles é desconhecida ou, ao menos, estranha.
O descompasso da educação dita “tradicional”, em relação ao universo mais dinâmico da tecnologia é evidente na nossa sociedade. Fui letrado nas TCI’s tardiamente, no Ensino Fundamental não tive contato, não procurei esses mecanismos, assim como estes, por parte dos professores, não foram a mim exigidos. Mas, devo levar em consideração duas questões necessárias a este, atualmente, aparente problema: 1) estudei em uma escola muito pequena, aonde os fatores coesivos de solidariedade, como diria Durkheim da solidariedade mecânica, eram muito fechados. 2) sou de uma geração anterior a esta, acredito que a minha antiga escola já deve incentivar e, o mais interessante, ser incentivada pelos alunos a abordar estas questões e destas formas.
O Ensino Médio foi um ‘Festival de Power Points’. Por ser uma escola que possuía dois laboratórios de informática até relativamente organizados e um curso técnico de Informática (extracurricular) essas ferramentas se tornaram mais próximas a mim, mais reais e necessárias. Tive que aprender a usar o Power Point, acredito eu, ao mesmo que a maioria dos professores, que penavam para acompanhar alguns alunos. A escola também era maior, com uma diversidade maior de alunos que refletiam certos aspectos bem pontuais na sala de aula.
Aprendi, por fim, por uma necessidade, afinal, se as apresentações de algum trabalho em grupo não fossem em Power Point nenhum dos colegas prestava atenção. Eram pessoas difíceis aquelas. Mas, como afirmei do Ensino Fundamental, acredito que a escola de meu Ensino Médio hoje esteja bem mais adaptada à esta “dinâmica tecnológica”.
No meu ponto de vista de aluno, gostava mais das aulas “tradicionais” e via os ‘Power Points’ como recursos do processo, somente recursos que completavam um processo que se baseava muito mais na relação entre turma e professor. Como futuro professor mantenho esta minha primeira posição: a tecnologia é um recurso, no entanto o letramento tecnológico é essencial. Assim como o conceito de sombra em Jung ( "A principal contribuição da obra de Jung reside na definição das tipologias de personalidade, na qual a ênfase não reside na dualidade entre os opostos, mas sim na complementaridade e integração com vistas à saúde, tanto individual quanto nas relações interpessoais." Nadie Machado), a educação deve ser vista como um processo de construção em que os pares, ou as oposições, não se baseiem essencialmente em um conflito. As partes definidas não devem ser desassociadas, mas postas em um mesmo plano de integração. A tecnologia na educação se apresenta dessa forma, essencialmente. 


terça-feira, 18 de setembro de 2012

O Processo da Diferença

Encontro diversas dificuldades em formular um conceito de Identidade que seja geral, que abarque tudo que envolve a Identidade, que seja definitivo... Geralmente me rendo as diversas variedades que, realmente, a constituem. A autora, Woodward, explora muito em seu texto a questão da dicotomia, do sentido binário que a identidade pode possuir, inspirado na Lingüística de Saussure: a diferença, a oposição, a Identidade como sendo aquilo que "não somos", ao invés de ser aquilo que realmente "somos". Mas, como escrevi anteriormente, tenho uma certa dificuldade de extrair um conceito definitivo, por isso necessito de uma exemplificação, de uma elucidação.
O sistema eleitoral americano (Eleições Presidenciais) é muito confuso para nós brasileiros (talvez para o resto do mundo), pois lá o voto não é direto, no sentido mais puro que o conhecemos, além de não ser obrigatório. Os norte-americanos devem votar em um delegado estadual, pertencente ao Colegiado Eleitoral Nacional, e este, em tese, segue a orientação da maioria dos votantes na escolha do presidente. Cada estado americano possui o número de delegados correspondentes ao número de habitantes (o país possui no total 538 delegados, representando a Câmara e o Senado), ou seja, um estado como a Califórnia (mais populoso dos Estados Unidos) possui 55 delegados. Cada estado possui sistema próprio de votação e o candidato que ganhar a eleição no estado leva os votos de todos os delegados, sistema conhecido como: "the winner takes it all" (O vencedor leva tudo). Por exemplo: o candidato que ganhar na Califórnia levará os 55 votos, em uma corrida onde o futuro presidente deve fazer no mínimo 270 votos no Colegiado. Um sistema que gera várias aberrações, como na eleição de 2000 quando George Bush, mesmo perdendo a eleição geral por 500 mil votos de Al Gore, se sagrou vencedor. O sistema existe desde a primeira Constituição americana (1787) e serve como um exemplo à questão da Identidade e da Diferença.
Além das aberrações eleitorais que o sistema produz, como a vitória de um presidente que não recebeu a maioria dos votos, o sistema eleitoral americano também legitima uma dominação, principalmente nos estados do sul, de uma "elite" racial. Segundo o professor Alexander Keyssar, da Universidade de Harvard, o Colegiado americano veio bem a calhar às elites brancas dos estados do sul na hora de decidir um presidente, pois, por serem a maioria, os brancos sempre vencerão. Mesmo que populações imensas de negros e hispânicos votem no presidente A, por exemplo, o seu poder de decisão nem constará num todo, pois como "O Vencedor Leva Tudo", esses votos nunca irão aparecer. Essa estranha equação além de diminuir a participação política dessas populações, fortalece uma divisão apresentada desde a Guerra Civil Americana (Confederados e Defensores da Escravidão no Sul e o Norte com as defensores da Abolição) e que se sublima em um sistema bipartidário muito bem definido. Segundo Lévi-Strauss, somos muito mais o que não comemos do que o que comemos, ou seja, enxergamos muito mais nossa identidade no outro, que não somos, enquanto não buscamos a definição do que realmente somos, gostamos dessa dualidade. O sistema do Colegiado norte-americano legitima essa diferença no sentido mais nefasto dela mesma. Em 1964, o presidente Lyndon Johnson, ao sancionar a Lei dos Direitos Civis, disse: "Acabamos de entregar o sul dos Estados Unidos ao partido Republicano e demorará muito para que essa situação se reverta".
A famosa foto ao lado, de Elizabeth Eckford, 15 anos, mostra esta "diferença" imposta de forma totalmente autoritária, semeada ao longo da história e ainda explosiva, nos Estados Unidos. A foto documenta a primeira vez que negros e brancos dividiriam uma escola no sul dos Estados Unidos, somente em 1957. Elizabeth era uma dos nove estudantes que ingressaram na escola de Little Rock, no Arkansas e que, sob vaiais e gritos racistas, entraram na escola Central High School. A foto fala por si.
Os diversos grupos que existiram e ainda existem, nos Estados Unidos e em todo mundo, que continuam reproduzindo esse mesmo "não-saber" que transforma a diferença em violência e que ataca o multiculturalismo como sendo a razão de todos os problemas de seu país, assim como de sua vizinhança, continuam tentando se fazer definitivos, continuam tentando angariar elementos que os legitimem. O sistema eleitoral americano serviu, de certa forma, como essa legitimação, serviu como intimidação. Assim como no texto de Woodward, quando ela cita os sérvios e os bósnios na Guerra de Bósnia de 1992, muitas vezes buscamos invocar raízes históricas para construirmos a imagem do "outro", que será o espelho reverso da formação do "eu". A busca de soluções simples para problemas complexos, assim como a unificação de uma opinião, em justificativa de uma unidade nacional, já cometeram milhões de assassinatos. Já produziram diferenças demasiadamente violentas. Conseguiram, muitas vezes, se legitimar a partir de um aparato burocrático. A dominação legítima, que tanto escreve Weber, é geradora da racionalização dessa diferença, que, a critério de princípio pode não querer dizer violência, mas, se analisada profundamente, retorce os conceitos e os transforma. A Identidade esta em constante construção e, apesar do que dizem os Essencialistas, não acredito que ela posso ser definitiva, não acredito que ela possa abarcar tudo que propõe.
A formação de um professor elucida também muito bem a questão da identidade não-definitiva, afinal, passamos por inúmeros processos e inúmeras experiências que se sobrepõem, fortalecem ou somam com as nossas experiências anteriores e constroem aquilo que seremos, ou somos. Apesar de o sujeito não ser uma tábua-rasa, da forma de Locke, ainda assim, para que o processo de aprendizado docente se complete da maneira mais correta possível, é necessário a abertura deste para tudo aquilo que venha a somar. O desejo de saber como um processo que envolve alunos e professores e que, em seu âmago, é a educação.


Meu único desejo é um pouco mais de respeito para o mundo, que começou sem o ser humano e vai terminar sem ele - isso é algo que sempre deveríamos ter presente
Claude Lévi-Strauss


Algumas Referências:

http://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/the-new-york-times/2012/09/12/romney-usa-propagandas-politicas-de-teor-racial-para-atrair-eleitores-brancos.htm

http://revistapiaui.estadao.com.br/edicao-62/anais-da-fotografia/odio-revisitado

http://argemiroferreira.wordpress.com/2008/11/23/o-legado-racista-no-processo-eleitoral-dos-eua/

http://www.youtube.com/watch?v=SpLRpu0cWJM

http://www.revistasusp.sibi.usp.br/scielo.php?pid=S0034-83091994000100022&script=sci_arttext

Anexos:

Música escrita por Abel Meeropol e cantada por Billie Holiday, primeira música a tratar e condenar o racismo nos EUA.


Strange Fruit Billie Holiday
Southern trees bear a strange fruit
Blood on the leaves and blood at the root
Black bodies swinging in the southern breeze
Strange fruit hanging from the poplar trees

Pastoral scene of the gallant south
The bulging eyes and the twisted mouth
Scent of magnolias, sweet and fresh
Then the sudden smell of burning flesh

Here is fruit for the crows to pluck
For the rain to gather, for the wind to suck
For the sun to rot, for the trees to drop
Here is a strange and bitter crop 

Fruta Estranha Billie Holiday

Árvores do sul produzem uma fruta estranha,
Sangue nas folhas e sangue nas raízes,
Corpos negros balançando na brisa do sul,
Fruta estranha penduradas nos álamos.

Pastoril cena do valente sul,
Os olhos inchados e a boca torcida,
Perfume de magnólias, doce e fresca,
Depois o repentino cheiro de carne queimada.

Aqui está a fruta para os corvos arrancarem,
Para a chuva recolher, para o vento sugar,
Para o sol apodrecer, para as árvores deixarem cair,
Aqui está a estranha e amarga colheita.

http://www.vagalume.com.br/billie-holiday/strange-fruit-traducao.html#ixzz26p1L32vg




sexta-feira, 31 de agosto de 2012

A escolha

É complicado ter uma razão para explicar a escolha pela docência. É difícil explicar a razão, quando esta está ausente. Todas as escolhas que tomamos estão determinadas por uma dualidade um tanto quanto simplista; ou seja, uma dualidade à caráter da vida: Temos, nelas, o que vem para nós desde o princípio (genética) e temos a nossa tábua rosa, como diria Locke, que esta somente sob nossa inteira responsabilidade. Somos o resultado disso. O fato de minha mãe ser professora me influencia dos dois jeitos, nesse ponto. A determinação do exemplo somado a uma autonomia construída a partir do próprio medo de ver a vida, não sei porque medo, mas ele com certeza permeia muitas das escolhas. Escolhi ser professor por isso, para poder circular dentro dos assuntos sem o comprometimento com uma verdade, ou com A verdade. Não acredito no professor definitivo, no professor formatado que vocifera seu lado perante pessoas que esperam muito dele, que acreditam nele. Tinha medo desses. Cada um tem sua função, é verdade, é necessário uma dinâmica, uma "mecanicidade", para as coisas funcionarem, mas pretendo circular dentro disso. Quero ser professor também pelos ótimos professores que tive, que me fizeram crescer e, o mais importante, me fizeram perceber esse crescimento. Tive poucos desses, mas que foram tão importantes que ofuscaram os outros que se somavam mais as paredes do que com os alunos em sala de aula. Razões utilitaristas, ou pragmáticas, não existem na escolha pela docência e espero que a minha identidade tal como Professor seja construída a partir de um caminho de autonomia e percepção perante aquelas pessoas que necessitam e que somam. O professor não o é somente em sala de aula, ele é professor nas 24 horas do dia.       
O verdadeiro professor defende os seus alunos contra a sua própria influência.